Nessa semana acabei me perdendo numa pesquisa de uma referência utilizada em um pôster antigo. Fui parar em um curta metragem chamado “Ver e Ouvir”, dirigido por Antônio Carlos da Fontoura em 1966. Ele retrata três artistas plásticos do Rio de Janeiro: Roberto Magalhães, Antonio Dias e Rubens Gerchman.
Tive oportunidade de ver as obras de Dias e Gerchman em passeios de revigorar a alma no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro e no Museu de Arte do Rio. São obras que me marcaram muito à primeira vista. Quando está no traço, o Antonio Dias é brutal. Ele consegue desmembrar depois a coisa toda em objetos e superfícies tridimensionais de forma muito visceral. Gerchman é um liquidificador, um computador aguerrido, da cultura de consumo de um Brasil em plena juventude da vida urbana. Já a fala de Roberto Magalhães sobre retomar a infância na própria obra é muito bonita.
Deixo com vocês a seguir a transcrição de uma passagem do filme. Ele pode ser assistido na plataforma Porta Curtas mediante cadastro de perfil. Como lá é um acervo valioso da produção de curtas-metragens brasileiros, vale a pena fazer uma continha no site.
No tumulto de vozes e barulhos, slogans, casas de disco, invisíveis circuitos elétricos, a cidade simultânea se cria e se decifra. Sua realidade é um alarido. A fala da cidade, unânime e fragmentária, se faz ouvir por toda parte. Dentro deste tumulto há pintura. Um homem que pinta, fala: os espelhos da infância, as máscaras da violência, as caixas da solidão – mercadorias que a cidade consome disfarçadas em refrigerantes, notícias de guerra e baterias de cozinha. A pintura fala. E o mesmo alarido, que lhe sufoca a voz, a faz gritar, com slogans, o sonho, o amor, a solidão.
A linguagem se rompe.
Não sei se foi o impacto de ver uma filmagem gravada há tanto tempo, com um ritmo bastante diferente dessa estética rápida-vídeo-de-youtube que hoje em dia tá em todo filme, mas há uma aura de sonho muito bonita em ver as pessoas e multidões no fim do curta. Talvez seja efeito do isolamento. Aguardo a vacina olhando pro mundo que passou como uma grande ficção. 🙂
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